O GENOCÍDIO PALESTINO E AS REAÇÕES DO MUNDO. Por Mariana Schlickmann e Paulino Cardoso

O GENOCÍDIO PALESTINO E AS REAÇÕES DO MUNDO

Por Mariana Schlickmann e Paulino Cardoso

Mundo Multipolar, 25 de maio de 2021.


O presente artigo tem por tema o genocídio palestino e as reações do mundo. Mas uma vez Israel agride os palestinos em Jerusalém e na Faixa de Gaza, como o mundo se posiciona?

Para compreender as diferentes reações no mundo, precisamos distinguir as reações da opinião pública de um modo geral, os diferentes povos e movimentos sociais que em toda parte tem se solidarizado ao povo palestino e seus anseios de libertar se da opressão sionista.

A Mídia Corporativa Ocidental, alinhada às diretrizes dos órgãos de gestão da opinião pública dos seus respectivos países, produziu uma análise enviesada e desequilibrada sobre a violência em Israel e nos Territórios palestinos ocupados, coerente com tese de que o Estado Judeu tem o direito de defender sua população civil.

Os EUA, para decepção de alguns poucos progressistas, desde o início da jornada de onze dias, posicionaram-se ao lado de Israel, inclusive impedindo por diversas vezes a manifestação do Conselho de Segurança da ONU sobre a violência, especialmente contra civis na Guerra de Israel contra o povo palestino. Enquanto publicamente, por meio do Egito, negociavam com o 1º Ministro de Israel e o Hamas, a celebração de um cessar fogo, que passou a vigorar na madrugada do dia 21 de maio, discretamente liberavam novos créditos de guerra para compra de armamentos por parte de Israel.

Neste sentido, aliados atlanticistas (grupo de países que defende uma hegemonia ocidental no mundo, através da OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte, e liderada pelos EUA) como Áustria, República Tcheca e até o Brasil de Jair Bolsonaro, reproduziam um release do Departamento de Estado dos EUA, afirmando que a posição estadunidense é a deles também. Já a França e a Inglaterra, reprimiram manifestações pró-palestina em seus países e a Alemanha, com seu eterno complexo de culpa em relação ao Holocausto durante a II Grande Guerra, perfilou ao lado do Estado sionista.


A surpresa positiva, talvez por conta da filiação à Irmandade Muçulmana do grupo político que está na presidência da Turquia, foi de Recep Erdogan, presidente turco, que se posicionou a favor do Movimento de Resistência Islâmica Hamas.

A Turquia, que é uma potência regional, comprometeu todos os esforços de normalização da sua política com Israel. Mesmo que ambos tenham atuados juntos na Síria, e principalmente no recente conflito na Região de Nagorno Karabach, envolvendo Armênia e Azerbaijão.

Recep Erdogan, presidente da Turquia

 Quando começaram a ser despejadas bombas em Gaza e na Cisjordânia, Erdogan não mediu palavras. Atacou violentamente a posição de Israel, bem como atacou o principal financiador e avalista das posições genocidas de Israel, que é a Administração Biden/Harris. Segundo ele, Biden, o presidente estadunidense, tem as mãos sujas do sangue palestino. 

Joe Biden e Kamala Harris, presidente e vice dos EUA

De fato, diferente de alguns países árabes, o presidente Erdogan não subordina suas posições políticas às questões econômicas da Turquia. E olhe que Israel e Turquia são parceiros importantes na importação do gás do Mar Mediterrâneo.

Talvez, como já nos lembrou o jornalista do Asia Times, Pepe Escobar, o peso da herança Otomana pese sobre o líder turco. De algum modo, Jerusalém ainda ocupa um lugar estratégico no imaginário dos povos. Quem defende e/ou conquista Jerusalém, desfruta de prestígio no coração de bilhões de pessoas no mundo.

Com alguma frustração nós sentimos um pouco a posição tomada pelos líderes do Sul Global, como Rússia e China, que foi menos enérgica do que o esperado. Em especial com a Rússia, que atuou de forma muito importante dando suporte a Síria, o que levou a derrota do Estado Islâmico e da Estratégia de Guerra Híbrida promovida pelo Ocidente. E, igualmente, no apoio ao Governo da Venezuela, que se viu totalmente bloqueado política e economicamente pelos Estado Unidos e seus aliados.

Neste sentido, Andrew Korybko, analista estadunidense sediado em Moscou, pode trazer algumas respostas. Em primeiro lugar, devemos deixar de lado a identificação da Rússia e da China com o internacionalismo proletário dos tempos socialistas. Ambos os países atuam no mundo em defesa, antes de tudo, dos seus interesses nacionais. Sejam eles econômicos como da China e a importância de Israel no projeto de Novas Rotas da Seda e como lugar de investimento em infraestrutura. Sejam geopolíticos, como no caso da Rússia, que com seus aviões e soldados no terreno, está cada vez mais presente na Ásia Ocidental. Como atores geopolíticos de relevância, ambos precisam se apresentar com posições equilibradas de modo a manter a interlocução com diferentes atores em disputa.

Diferente dos EUA e seus aliados atlanticistas, Rússia e China, não se colocam como portadores de um papel excepcional no mundo. Eles não submetem seus aliados a uma política de soma zero, na qual as únicas opções dadas são ou se reduzirem a vassalos ou objeto a destruição e rapinagem.

Como afirmou o chanceler chinês Wang Ji, não pensam que as instituições, como a democracia, são como uma Coca-Cola, que tem o mesmo sabor em qualquer lugar. Ou seja, a democracia não deve ser padronizada, exatamente igual em todos os lugares.

Conselheiro de Estado e ministro das Relações Exteriores da China, Wang Ji

China e Rússia tem defendido que não é possível que apenas alguns países estabeleçam regras para serem seguidas pelo restante do mundo, enquanto nem eles mesmos as obedecem. Por isso, estes países vêm reafirmando que as regras que devem nortear a ação dos atores políticos no mundo, são as do direito internacional. Consensuado pela comunidade de nações, observando a centralidade da Organização das Nações Unidas para a resolução de controvérsias e enfrentamentos dos desafios de uma humanidade cada vez, como diria o presidente da China, Xi Jiping, presa a um futuro compartilhado.

O Multilateralismo, como nos lembra Serguey Lavrov, chanceler da Federação Russa, deve estar alicerçado no Direito Internacional, consequentemente, em se tratando da violência nos territórios ocupados, significa em primeiro, reconhecer o Direito a existência do Estado de Israel no interior de suas fronteiras anteriores a 1967, ano em que oficialmente Israel começou a se expandir e ocupar territórios palestinos de forma ilegal. Mas, igualmente, o direito do povo palestino a constituição de seu Estado soberano, o que significa o recuo dos assentamentos ilegais israelenses, o controle da gestão da água em toda Palestina e o respeito aos lugares sagrados. 

Serguey Lavrov, chanceler da Federação Russa

Ressalve-se, a importância do papel da China, enquanto presidente rotativa do Conselho de Segurança da ONU, que não mediu esforços para mobilizar o conselho na pressão sobretudo a Israel para paralisar a agressão contra civis. De acordo com José Reinaldo de Carvalho, do CEBRAPAZ e editor internacional do Brasil 247, estes esforços foram sabotados a todo momento pelos EUA. Os estadunidenses tentaram impedir que a China, por meio da ONU e com anuência das Nações que compõem o Conselho de Segurança, conseguisse enfrentar de forma positiva um conflito que atravessou todo o século XX e permanece sem solução até hoje.

 O cessar fogo foi anunciado pelo Gabinete de Bibi Netanyahu, 1º Ministro de Israel, e aceito pelo Movimento de Resistência Islâmica, o que foi visto como uma vitória do povo palestino no enfrentamento com um dos exércitos mais bem preparados e armados do planeta. A violência até aquele momento que levou a morte de mais duas centenas de civis, muitos deles mulheres e crianças, e mais de mil feridos e cerca de setenta mil deslocados. 

Bibi Netanyahu

O saldo positivo é que a bolha da Mídia Corporativa Ocidental, em seu desejo de monopolizar a narrativa em todo mundo, desta vez não foi efetiva, pois milhares de pessoas em várias cidades do mundo se mobilizaram em defesa dos direitos dos palestinos. Israel, goste ou não, aprendeu que não é invencível, e isso, quem sabe signifique a queda de Bibi Netanyahu.





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