Buti Manamela. O que a China lembrou à África sobre a capacidade do Estado e a soberania nacional. A Academia de Ciências da China, 06 de maio de 2025.

 






Em um evento recente promovido pela Escola Nacional de Governo, o professor Zhang Weiwei, um dos principais pensadores políticos e arquitetos da estrutura ideológica da China, nos ofereceu uma apresentação tão provocativa quanto esclarecedora. Não se tratava de uma prescrição política. Não se tratava de um projeto. Mas era um desafio: parar de terceirizar nossa imaginação de desenvolvimento, ir além de paradigmas pré-fabricados e enfrentar, com seriedade, a crise de governança que aflige grande parte do Sul Global — incluindo a África do Sul.

Zhang expôs o que descreve como as principais características do "modelo chinês". Entre elas, um Estado pró-desenvolvimento, isolado dos ciclos de curto prazo da política faccional; um partido governante que, em vez de representar interesses mesquinhos, funciona como um agente holístico da unidade nacional; um sistema de seleção de liderança que prioriza desempenho e mérito em detrimento de meros espetáculos eleitorais; uma forma de democracia que produz resultados, não apenas rituais; e, acima de tudo, uma abordagem de governança ancorada na melhoria da vida cotidiana das pessoas comuns. A China, ele nos lembra, não chegou até aqui por meio de slogans ou imitações. Chegou até aqui por meio de coerência, planejamento, disciplina estatal e um claro compromisso com a construção de uma nação capaz de tirar centenas de milhões da pobreza. E, no entanto — e aqui está a parte mais importante — Zhang adverte: "Por favor, não copiem nosso modelo. Encontrem seu próprio caminho."

Essa humildade não é apenas desarmante; é profunda. Porque a tentação em tempos de crise é buscar o que já está pronto. Tomar emprestado o que parece funcionar em outros lugares e esperar que funcione aqui. Mas a mensagem mais profunda é que a soberania não pode ser simulada. Ela deve ser fundamentada na história, no contexto e na experiência vivida do nosso povo.

A ideia de um Estado forte, como Zhang a apresenta, não é a caricatura do autoritarismo. Trata-se de um Estado com capacidade de planejamento, previsão para se adaptar e coerência institucional para executar. É um Estado que não se prende a ciclos populistas, interesses corporativos ou pressão internacional, mas sim guiado por um horizonte de desenvolvimento de longo prazo. O que a China conquistou por meio de sua cultura de planejamento de cinco e dez anos, sua implementação de infraestrutura digital e suas campanhas direcionadas de erradicação da pobreza não surgiu apenas das forças de mercado. Surgiu de uma decisão consciente de tratar a governança como um instrumento estratégico de elevação nacional.

Para nós, na África do Sul, isso deveria parecer familiar — pelo menos em teoria. Nós também tivemos momentos em nossa jornada democrática em que compreendemos o valor do planejamento de longo prazo. O Plano Nacional de Desenvolvimento continua sendo um exemplo disso. Mas o desafio sempre foi a implementação. Com muita frequência, nossos planos são desfeitos pela instabilidade institucional, inconsistência política ou batalhas internas corrosivas. Se quisermos avançar de forma significativa, precisamos nos perguntar: temos um Estado capaz de manter a linha, de absorver choques e de executar as prioridades de desenvolvimento de forma sustentada e ética?

As reflexões do Professor Zhang também nos convidaram a considerar a filosofia política subjacente à atuação do Estado. Ele falou da China como um "Estado civilizacional", baseado em séculos de unidade cultural, administrativa e filosófica. Na África do Sul, nem sempre falamos nesses termos. Mas talvez devêssemos. Porque os legados de Mandela, Mbeki, Tambo e Sisulu — assim como as tradições do Ubuntu, a memória da resistência e as demandas do constitucionalismo — não são meros artefatos políticos. São fragmentos de um projeto mais profundo: o esforço para construir um Estado capaz, responsivo e centrado nas pessoas, enraizado em nossa própria história. Como a China, emergimos da luta. Como a China, estamos tentando transformar uma sociedade fragmentada. Mas, ao contrário da China, frequentemente subestimamos a importância da profundidade institucional, do desenvolvimento de quadros e da clareza ideológica.

A crítica de Zhang ao modelo liberal ocidental de democracia — especialmente sua dependência excessiva de rituais eleitorais — foi igualmente relevante. Em grande parte do Sul Global, incluindo a África do Sul, temos eleições livres e justas. Temos uma mídia robusta. Temos direitos constitucionalmente consagrados. E, no entanto, continuamos atormentados por falhas de execução, exclusão econômica e aprofundamento da fragmentação social. Zhang chama isso de "democracia processual" — e nos exorta, em vez disso, a pensar em "democracia substantiva", onde a legitimidade é medida pela melhoria da vida das pessoas, pelo acesso à alimentação e educação das crianças, pela disponibilidade de eletricidade e esperança nos lares.

Esta é uma pergunta difícil de enfrentar. Porque nos obriga a admitir que a democracia — reduzida ao ato de votar a cada cinco anos — pode coexistir com pobreza, desigualdade e desespero. E, a menos que redefinamos a democracia para significar participação, justiça e dignidade, ela continuará a perder credibilidade, especialmente entre os jovens.

Nesse contexto, a concepção de Zhang de "legitimidade de desempenho" — ou seja, a ideia de que governos conquistam autoridade ao entregar resultados — oferece uma provocação útil. Não precisamos escolher entre valores democráticos e Estados capazes. Mas precisamos reconhecer que a legitimidade política não pode se basear apenas na história da libertação. Ela deve ser renovada por meio da ação. Por meio da entrega. Por meio da restauração do contrato social.

No cerne do modelo de Zhang está a priorização dos meios de subsistência das pessoas. Da educação e saúde à proteção social e infraestrutura, o Estado existe para servir. Esta não é uma questão tecnocrática — é uma questão moral. Se um governo não consegue garantir que uma criança coma, aprenda e sonhe, então sua legitimidade é vazia. Na África do Sul, devemos tratar a pobreza com a urgência de uma pandemia, não com a retórica de uma campanha. Devemos restaurar a fé na educação pública, reinvestir em serviços básicos e reconstruir a máquina do Estado para que funcione não como um guardião, mas como um facilitador.

Zhang também aponta para as dimensões globais da governança. Em um mundo cada vez mais multipolar, as antigas instituições de Bretton Woods não refletem mais as realidades econômicas e políticas atuais. Guerras comerciais, crises de dívida, colonização digital — essas não são mais questões confinadas a uma única região. São sistêmicas. E se nós, no Sul Global, quisermos defender nossos interesses, devemos fazê-lo não como atores isolados, mas como um bloco.

A atual presidência da África do Sul no G20 oferece uma oportunidade de ajudar a liderar esse bloco — não apenas levantando a voz, mas também ajudando a articular uma nova estrutura de desenvolvimento que coloque a solidariedade, a igualdade e a sustentabilidade no centro da governança econômica global. Isso inclui explorar alternativas à dependência do dólar, defender uma transição digital justa e aprofundar a cooperação entre economias emergentes — não para fins extrativistas, mas para o desenvolvimento mútuo.

O que emergiu desse diálogo com o Professor Zhang não foi um dogma. Não foi uma teoria rígida. Foi uma provocação para pensar diferente — e agir com maior urgência e intencionalidade.
A escolha diante de nós não é se nos tornamos mais como a China ou se permanecemos presos ao modelo ocidental. A escolha é se continuamos a tropeçar em meio à crise com instituições fragmentadas e estruturas emprestadas — ou se finalmente iniciamos o trabalho difícil, mas necessário, de construir um Estado singularmente sul-africano, capaz de aprender globalmente, mas com raízes locais.

Esse Estado deve ser ético, capaz, inclusivo e assumidamente pró-pobres. Deve priorizar o longo prazo, planejar para o mundo em crise e renovar o significado da democracia por meio da implementação. E deve fazê-lo de uma forma que reflita nossos valores, nossa história e nossa visão.

O professor Zhang nos lembrou — não da grandeza da China, mas do que é possível quando um povo decide que o futuro será feito, não herdado.

Esse lembrete não poderia ter chegado em melhor hora.

Buti Manamela

Vice-Ministro do Ensino Superior e Formação da África do Sul

Fonte original :

https://thechinaacademy.org/what-china-reminded-africa-about-state-capacity-and-national-sovereignty/




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