Mision Verdad. Lula autoriza OTAN a definir defesa cibernética do Brasil. Mision Verdad, 12 de junho de 2025.

 


O Brasil foi o único país latino-americano entre as 41 nações ocidentais que participaram do " Locked Shields ", o maior exercício de defesa cibernética organizado pelo Centro Cooperativo de Excelência da OTAN. Essa posição única o coloca no centro de uma plataforma dominada por doutrinas e protocolos projetados para potências atlânticas.


O governo Lula da Silva proclama uma visão multipolar e afirma distanciar-se das prioridades estratégicas ocidentais, mas, na prática, adota os manuais e métodos da OTAN. Ao integrar seus protocolos de defesa cibernética e seguir os mesmos regimes de treinamento, o Brasil reforça uma dependência tecnológica que conflita com seu discurso ideológico e reduz sua capacidade de resposta autônoma às crescentes ameaças digitais.


Subordinação com diferentes faces

Na região, existem vários países que, aberta ou secretamente, giram dentro da órbita estratégica da OTAN e dos Estados Unidos. Alguns já estão listados como parceiros oficiais, outros buscam ativamente esse reconhecimento e outros ainda estão avançando em direção à integração de fato por meio de acordos militares, cooperação energética ou exercícios conjuntos.


Colômbia.  Além de ser o único país latino-americano a deter o status de "Aliado Principal Não-OTAN", foi também o primeiro país parceiro a assinar um ITPP  (Plano de Ação de Parceria Individual) em 2021. Este acordo único institucionalizou uma cooperação que hoje abrange áreas críticas como segurança cibernética, contraterrorismo, combate à corrupção e segurança marítima, alinhando diretamente as prioridades colombianas com os interesses estratégicos da Aliança.

Argentina. Sob o governo de Javier Milei, o país adotou uma retórica claramente subserviente ao Ocidente, evidenciada por seu apoio incondicional à Ucrânia, sua reaproximação com o FMI e seu alinhamento automático com os EUA. Em consonância com essa postura, em 18 de abril de 2024, Buenos Aires solicitou formalmente à OTAN  o status de "parceiro global", buscando explicitamente integrar-se à arquitetura de segurança ocidental.

O Chile mantém uma relação peculiar com a OTAN como "País Não Patrocinado pela OTAN de Nível 1", um status que lhe concede acesso limitado à Aliança. Essa subordinação ao Ocidente é confirmada por ações como a participação do Chile no RIMPAC 2024  (um exercício liderado pelos EUA no ano passado com membros da OTAN e Israel).

Guiana.  Embora não tenha expressado formalmente a intenção de ingressar na OTAN, a Guiana deixou de ser um país geopolítico periférico para se tornar um enclave estratégico  para os interesses energéticos dos Estados Unidos e seus aliados em apenas alguns anos. A descoberta de vastas reservas de petróleo em águas disputadas com a Venezuela transformou o país em um protetorado energético, onde a ExxonMobil lidera a exploração, enquanto o exército guianense recebe treinamento de Washington .

Equador.  No início de 2024, o presidente Daniel Noboa recebeu a liderança do Comando Sul , chefiado pela General Laura Richardson, para estabelecer um roteiro conjunto para defesa, segurança cibernética e combate ao narcotráfico. As relações se fortaleceram em fevereiro de 2025, quando Noboa autorizou a entrada de forças especiais estrangeiras , principalmente forças americanas, para colaborar em operações internas. Sob o pretexto da emergência de segurança, o Equador está se integrando cada vez mais ao aparato militar regional dos Estados Unidos.

Dado que esses e outros países da região são abertamente mais dependentes dos alinhamentos de Washington, é o Brasil que, por meio de ações concretas, legitima a presença da OTAN no continente a partir de uma posição de aparente autonomia.


Brasil na rede da OTAN

A participação do Brasil em exercícios como o Locked Shields responde a uma inércia institucional que prolonga acordos herdados de Jair Bolsonaro. Como alerta o analista geopolítico brasileiro Raphael Machado, o atual governo Lula não tem "vontade política nem interesse" para reverter essa linha de subordinação.


O país carece de uma estratégia nacional de defesa cibernética que abranja todo o aparato estatal. O Comando Cibernético de Defesa (ComCiber), inicialmente concebido para cumprir essa função, limitava-se à proteção interna do sistema de TI do Exército. Essa fragilidade estrutural questiona o valor da participação em exercícios cujas regras, ameaças e objetivos são determinados por atores externos. Machado observa: "Quais benefícios tangíveis o Brasil poderia obter com esses exercícios? Muito poucos."


A adoção progressiva dos padrões da OTAN não implica apenas interoperabilidade técnica: significa, sobretudo, incorporar lógica operacional, critérios de ameaça e protocolos de resposta alinhados aos objetivos estratégicos do bloco ocidental. Nas palavras do autor, esse processo levaria o Brasil a adotar doutrinas estrangeiras e a treinar suas próprias forças sob modelos externos, o que "criaria um nível de dependência em relação às nossas forças, que estão fracamente alinhadas aos interesses estratégicos do Brasil".


O paradoxo se intensifica quando se considera que as principais fontes de ataques cibernéticos contra a América Latina, segundo o relatório do F5Labs citado por Machado, são os Estados Unidos e a Lituânia, sendo esta última o país anfitrião do CCDCOE, órgão organizador do exercício Locked Shields.


Além disso, o Brasil construiu grande parte de sua infraestrutura estatal de TI com base em tecnologias de grandes empresas americanas, com sistemas operacionais como o Windows, conhecido por conter "backdoors" que permitem acesso a agências como a NSA. A suposta integração para fortalecer a segurança digital acaba sendo, na realidade, uma abertura estrutural à vigilância estrangeira. "Ao conectar nossa segurança cibernética às estratégias e sistemas da OTAN, na verdade, reduzimos nossa segurança cibernética", diz Machado.


Esse padrão de dependência não se limita às Forças Armadas. A Polícia Federal brasileira utiliza o software israelense Cellebrite Premium, o que, nas palavras do autor, torna a instituição "uma ferramenta influente para a CIA e o Mossad no Brasil". A espionagem israelense já deixou precedentes documentados no país, incluindo o assassinato de um cientista nuclear brasileiro.


A integração em simulações como Cyber ​​Defense Wonder 4 (março de 2024) e Cyber ​​Guardian 6.0 (outubro de 2024), ambas lideradas por países liderados pela OTAN, apenas reafirma a mudança estratégica do Brasil em direção a uma arquitetura de subordinação tecnológica.


Do multilateralismo ao serviço atlântico

Em vez de aproveitar o ambiente multipolar para construir alianças verdadeiramente autônomas e estrategicamente equilibradas, o governo Lula opta pela integração passiva em estruturas projetadas para atender às necessidades de Washington. Sob o pretexto de cooperação, o Brasil está cedendo sua soberania digital, expondo seus sistemas a potenciais mecanismos de vigilância estrangeira e treinando suas forças sob doutrinas que não refletem sua realidade geopolítica.


Enquanto a retórica oficial enfatiza a soberania e o equilíbrio multipolar, a prática do governo favorece a consolidação da influência atlântica no continente. Dessa forma, o Brasil está perigosamente perto de assumir o papel de plataforma regional da OTAN, sob a ambígua aparência de mediador neutro.


— Somos um grupo de pesquisadores independentes dedicados a analisar a guerra em curso contra a Venezuela e suas implicações globais. Nosso conteúdo é gratuito desde o início. Contamos com doações e contribuições para apoiar este projeto. Se você quiser contribuir para a Misión Verdad.

Fonte: https://misionverdad.com/globalistan/lula-autoriza-que-la-otan-defina-la-defensa-cibernetica-de-brasil

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Marjorie Cohn. A distinta carreira de Kamala Harris servindo à injustiça. Consortium News, 22 de julho de 2024.

Gabriel Merino. DeepSeek e o “Momento Ford” da Economia Global. Misíon Verdad, 26 de fevereiro de 2025.

Joanna Rozpedowski.Donald Trump: America First encontra Groenlândia, Taiwan e o Canal do Panamá. Responsible Statecraft, 07 de janeiro de 2025.